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Coisa de mar

Eu vi uma coisa e a coisa era dela era o vento na vela  num raio de mar Eu vi uma coisa no espelho do mar e a coisa era dela e o centro era ela Até o dia acabar

Agosto de dor

Agosto de dor   Longe ela vem e desmaia Certa de que só e triste A esperam na areia  Morna e suave Da praia  Agosto de dor   O sol já não queima O vento amaina A maré distante Abraça-a agora Entre as estrelas da noite Ela paira

Delito

 Vivo mil anos a tua cara e nela tenho gravada o teu grito Sou pedra rochedo o teu segredo sou regra credo e o teu medo Fixei o instante da tua angústia nesta prisão de pedra Sou a estátua da perfeição que a lei de tudo quebra e agora em todo o lado existo feita de crime e delito O meu maior foi ter-te a ti  Aqui onde estou sou perigo Sou perigo. 

Um Avião

Marquei uma cruz no céu Com um avião Era cinzento e parecia Um Cristo a querer abraçar a Terra. Dispus assim Acima de mim Uma fórmula Que fosse fácil de acreditar. 

Reportagem

Russel Square magoou a perna e gritava "Eu sou Russel Square! Eu sou Russel Square!" enquanto o levavam numa maca feita de braços, quase em apoteose. Perdoavam-no tudo, era um herói. Ditava modas, Russel Square era o nome dele e tinha-se magoado na perna. Levavam-no em braços, gentil e dolorosamente, os jovens e as jovens pela rua abaixo até ao buraco que dava para as instalações deles, escondidas mesmo debaixo da minha rua. Lá havia espaço, naquela gruta virgem feita ainda de planeta selvagem que existe debaixo das nossas cidades. Russel Square parecia ditar novas regras. Alguém discordava e Russel Square, com o olhar, mostrava-lhe onde era a saída daquele abrigo subterrâneo. Não sei descrever muito bem a aparência de Russel Square, era jovem, lá isso era, vinte e poucos, e os outros seguiam-no como se seguissem o único caminho possível, por ser o mais luminoso. Mas Russel Square vestia-se com roupa velha e suja, t-shirt, calções e botas. Tinha cabelo comprido, de origem m...

Sem Linhas, A Lápis

É demasiado plano, o desenho. Dizem que se tenho energia, que a energia vai toda para a cabeça, para o cérebro. E o corpo ressente-se. Pois o corpo não aguenta tamanha descarga. Aí, o corpo começa a lutar com a cabeça. Os dedos não param, as pernas querem ir a sítios, o corpo quer movimento. Mas o movimento não tem... O movimento tem medo. A mão escreve entretanto porque o movimento da mão diz coisas, ao contrário do movimento das pernas que só quer ir a sítios indiscriminados e por vezes perigosos. Já fui a sítios perigosos. São como os outros sítios, só que são sítios onde os lugares têm crimes e ódio e compaixão também, dentro deles. É tudo misturado, na cidade existe de tudo. O corpo quer ir embora porque a mente está agitada, está convexa, focada no infinito, se tal for possível. É preciso dar significado. Ir com calma, deixar a mão e a mente em harmonia para que o que se escreva tenha significado.  Penso que posso escrever muito até entrar em exaustão.  As pernas també...

No Chão

Cara metade Rogo tomar-te Assim que urge o acordar rude Bovino açafrão. Encontro à parte Uma mão que muge O sangue da ferida Do corpo leão Sapo inchado De água velado Sono crispado Assassino no chão.