A Vontade de Jaquelino Bragão Travassos (extracto diário)

Quero paz e quero que me deixem em paz. Não quero doutores de bata branca, nem pessoas, nem hospitais, nem gente atrás de mim. Quero estar sozinho no mundo, eu e a minha miséria e a minha auto-comiseração. Não quero mais remédios, placebos ou panaceias para a dor. Quero deixar-me explodir em modo natural. Quero fugir a isto tudo que parece uma prisão e não é. Quero rebentar com as sinapses. Quero não ver pessoas à minha frente. Quero ser reduzido à minha insignificância. Quero não ser julgado pelo que sou ou não sou. Quero ser simplesmente por aí. Quero existir e deixar a minha existência tomar o seu livre curso. Estou farto desta vida, de ter de querer aquilo que não tenho e de sentir o tédio dos dias na inércia dos olhares à minha volta. Quando é que isto tudo começou a tornar-se tão errado? Em que altura? Como é que tudo se tornou apenas nisto? Como? Como deixei chegar a este ponto? É um vazio tão grande! Já tive a minha vida tão cheia de planos e agora sinto-me um peão do tempo e das circunstâncias. Em tempos, lembro-me, fui agente do meu destino, voz activa e imperativa no campo de batalha que é a vida, herói da minha epopeia. Perdi-me nos meandros dos seus versos.

Nota: Extracto do diário do poeta/escritor Jaquelino B. Travassos do dia 14 de Abril de 1957. Consta que foi uma altura particularmente difícil da sua vida.

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