a matemática do bem maior

O Generalíssimo entrou triunfante pela porta adentro. Ansioso, esperava ver a nova decoração do seu gabinete. O Tenente-Coronel esperava-o, confortavelmente sentado no cadeirão do Generalíssimo, atrás da imperial e faustosa nova secretária de mogno com tampo de mármore e de pernas esguias que faziam lembrar as colunas do Olimpo. Este, pasmado com o atrevimento, abriu demasiado o olho caindo-lhe assim o monóculo que ficou estupidamente a balançar da corrente dourada e reluzente que o prendia da bolsinha da farda militar cor de azeitona que vestia impreterivelmente todos os dias, impecavelmente engomada sem quaisquer vincos.
O Tenente-Coronel esboçou um sorriso familiar, suas mãos repousavam calmamente nos braços do cadeirão do Generalíssimo, ao mesmo tempo que o enxergava com uma displicência curiosa, quase infantil.
Mas o Generalíssimo não via nada para além de ser um outro qualquer a ocupar-lhe o lugar e, para ele, o semblante do Tenente-Coronel era igual ao dele de todos os dias, o de seu braço-direito, leal e conformado com as suas extravagâncias e exigências. O Generalíssimo deu um passo atrás – o primeiro em toda a sua vida, pensou aterrado. E o Tenente-Coronel por fim ergueu-se e sempre impávido, desejou-lhe os bons dias e saiu do gabinete num passo estacado muito próprio da sua pessoa. Naqueles segundos acabara de fazer as contas da matemática de uma revolução: as incógnitas, naquela situação em particular, revelavam-se maiores que as variáveis, implicando — do ponto de vista estratégico ou teórico — a ausência de um plano táctico que na prática auferisse resultados desejáveis. O bem maior ficaria comprometido. A matemática não andava longe da ética, pensava ele, enquanto olhava para o relógio de pulso, admirando o rigor do ponteiro dos segundos.

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