o teu cigarro

Sabia que estarias aqui. Sozinho e o teu cigarro. Acossado e escondido neste ermo no fim do mundo. A tua imagem impressiona-me. Os teus olhos crescem à medida que o teu corpo se esvai. E tudo vai com o tempo, até tu, apesar de não o admitires. Julgas-te para além da vida e da morte.
Pedes-me vida aqui neste ermo. O dia começa para todos menos para ti.
Sei porque queres a minha presença. Queres viver, tens fome. E eu dou-te vida sempre que estou contigo. Sugas-me as forças, sacrifico-me em nome do teu orgulho e da tua fantasia.
Queres ser mais que os Homens. Está frio, o céu está azul - vi-lo nos teus olhos. Ainda mora um céu dentro de ti e sabes que tens esse poder sobre mim. Só que eu alimento essa loucura para não te perder, para que vivas, para além da morte.
Tudo em ti, para além da morte.
E tu deixas-te estar. Sabes que acabo sempre por vir até ti. Em tempos tinhas o sol em ti e dizias-me que que me levarias contigo - lembras-te?
Que subiríamos ambos ao zénite e lá seríamos um. Que o horror e o desespero acabariam no horizonte.
Mas tu continuas aqui, à minha espera. Rei e dono da minha vontade. Apagas o cigarro e, displicente, inclinas a cabeça para trás - e é essa a minha deixa: nunca te deixar.
Lembras-te da primeira vez?
Apagaras o teu cigarro à minha chegada e sorriste. Tudo mudou quando desafiaste o Universo. O mundo ficou mais escuro. Luz negra e fria de um deus menor.

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